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terça-feira, 27 de outubro de 2015


Cientistas usaram tremores na superfície dos astros para revelar pela primeira vez a intensidade dos campos magnéticos no seu interior

Até pouco tempo atrás, o magnetismo era em grande parte desprezado pelos astrônomos nos estudos sobre a formação, vida e morte das estrelas diante da predominância da gravidade e da pressão nestes processos. Nos últimos anos, porém, o desenvolvimento de técnicas e instrumentos que permitem observar e medir os campos magnéticos na superfície e no entorno de astros distantes e novos modelos teóricos indicam que esta força pode ter sim uma grande influência nisso, afetando características como velocidade de rotação e a mistura de materiais em seu interior que ajudarão a determinar sua evolução e destino.

Mas enquanto o ambiente magnético sobre e em volta das estrelas se tornou cada vez mais conhecido, a atuação desta força em seus núcleos, onde acontecem as reações que alimentam seu brilho e calor, permanecia um mistério para os cientistas. Agora, no entanto, uma equipe internacional de pesquisadores usou os tremores e oscilações que um tipo específico de estrelas sofre, numa técnica conhecida com astrossismologia, para sondar pela primeira vez seu magnetismo interno, revelando que algumas delas abrigam poderosos ímãs cósmicos que geram campos com intensidades até 10 milhões de vezes superior ao da Terra.

— Nós agora podemos investigar regiões das estrelas que antes estavam escondidas — conta Matteo Cantiello, especialista em astrofísica estelar no Instituto Kavli para Física Teórica da Universidade da Califórnia em Santa Bárbara, EUA, e colíder da pesquisa, cujos resultados foram relatados em artigo publicado na edição desta semana da revista “Science”. — A técnica é análoga a um ultrassom médico, que utiliza ondas sonoras para produzir imagens de partes do corpo humano que de outra forma seriam invisíveis.

No estudo, os astrônomos se concentraram em um tipo de estrela conhecido como gigante vermelha, um dos estágios finais da vida de astros como nosso Sol, que deverá alcançar esta fase daqui a cerca de 5 bilhões de anos. Neste estágio, as estrelas já esgotaram o estoque de hidrogênio, seu principal combustível, em seus núcleos. Com isso, elas progressivamente incham e esfriam, passando a “queimar” o hidrogênio ainda presente nas camadas em torno destes núcleos, agora compostos basicamente de hélio. Isto gera poderosas correntes de convecção entre as camadas externas da estrela, como as bolhas numa panela de água fervente, num cenário inerentemente instável que faz das gigantes vermelhas alvos ideais para investigações com a astrossismologia.

Nem todas as gigantes vermelhas, no entanto, são iguais. Enquanto a grande maioria destas estrelas exibe um comportamento chamado dipolar, em que seus processos internos fazem com que um de seus hemisférios alternem ente um mais brilhante que o outro, observações feitas com o telescópio espacial Kepler, da Nasa, mostraram que em algumas delas esta oscilação é atenuada. Segundo os pesquisadores, são justamente estas estrelas que as medições feitas com a astrossismologia indicam ter núcleos com magnetismo mais forte, gerando o que acreditam ser uma espécie de “efeito estufa magnético” que prende em seu interior parte da energia responsável por esta variação dipolar.

— Isto é excitante por demonstrar que os campos magnéticos internos têm um importante papel na evolução e no destino final das estrelas — avalia Sterl Phinney, professor do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e não envolvido diretamente com o estudo, para quem a descoberta pode ajudar a resolver o mistério do porquê alguns “cadáveres” estelares, como anãs brancas e estrelas de nêutrons, terem poderosos campos magnéticos. — Os campos magnéticos que eles encontraram nos núcleos destas gigantes vermelhas são comparáveis aos vistos em anãs brancas fortemente magnetizadas. Assim, o fato de apenas algumas gigantes vermelhas exibirem uma supressão do seu comportamento dipolar, o que indica campos intensos em seus núcleos, pode muito bem estar relacionado ao fato do porquê apenas algumas estrelas deixam para trás restos com fortes campos magnéticos depois que morrem.



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