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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Relatividade geral: uma senhora centenária

Buracos negros nada mais são do que restos mortais de estrelas gigantes (Foto: Nasa)
Alguns pensamentos instigadores levaram Einstein a questionar o paradigma de sua época. O que aconteceria se o Sol, por algum motivo, deixasse de existir?
Sabemos que o Sol é a responsável pelas órbitas dos planetas em seu entorno. Dessa forma, os oito planetas do nosso sistema deixariam de seguir órbitas elípticas e sairiam literalmente pela tangente de sua trajetória. Mas será que isso aconteceria instantaneamente assim que o Sol deixasse de existir? Até o começo dos anos 1990 achava-se que sim – em conformidade com a teoria newtoniana, que permite ações gravitacionais instantâneas e à distância. Esse ponto da teoria não parecia ser muito factível. Além disso, Einstein percebeu que a mecânica newtoniana e a sólida teoria do eletromagnetismo, descrita pelas belas equações de Maxwell, formavam um casal conflitante.
Enquanto trabalhava em um departamento de patentes, aparentemente com algum tempo livre, Einstein resolveu ir longe nas ideias e continuar seus questionamentos incomuns.Perguntou-se, não com essas palavras, o que aconteceria se viajasse sentado em um fóton (partícula de luz) e olhasse pra outro fóton ao seu lado, viajando a mesma velocidade, a da luz. Obviamente esse é um experimento mental que não poderia ser reproduzido.
Foi nesse contexto cheio de questionamentos que Einstein optou por apostar em Maxwell.Partindo de alguns conceitos impostos por ele, trilhou um árduo caminho que o levou primeiramente à Relatividade Especial e por fim à Vênus de Milo Relatividade Geral (RG). Para o início de toda a teoria, os conceitos impostos, chamados de postulados, foram dois:
A velocidade da luz é constante independentemente do referencial.
As leis da Natureza são as mesmas em todos os sistemas referenciais inerciais.
Desses postulados nasceu a relatividade restrita e, provavelmente, a equação mais famosa de todos os tempos: E=mc². Ela nos diz que massa (m) e energia (E) são equivalentes e que sua conversão é dada pela velocidade da luz (c). Essa equação poderosa infelizmente foi utilizada para fins sórdidos, como a construção da bomba atômica pelos EUA no projeto Manhattan. Entretanto, esse fim foi terminantemente abominado por Einstein.
Não satisfeito com sua brilhante teoria, Einstein foi adiante e em 1915 apresentou sua Teoria da Relatividade Geral. Maravilhosa! 10 equações distintas elegantemente descritas pelo que parece ser apenas uma:
 (Foto:  )

 
Mas, acredite: são 10 equações diferentes.
Na extrema esquerda temos um termo simbolizando a geometria do espaço-tempo, na extrema direita temos matéria e energia. Ou seja, Einstein, através dessa equação, apresenta o princípio da Relatividade Geral: a matéria deforma a geometria do espaço-tempo e vice-versa.
A Relatividade Geral passou por diversos testes onde sua autenticidade foi primorosamente verificada. Além disso, as equações de Einstein originaram alguns dos temas mais instigantes e atuais, seja para o mundo científico, seja para a população, como buracos negros e ondas gravitacionais. Buracos negros surgem como uma solução da RG. Sua matemática é complexa, mas seu conceito é facilmente compreendido. Nada mais são do que restos mortais de estrelas muito massivas (em torno de pelo menos 10 vezes a massa do nosso Sol). Por ser pouco massivo comparado às outras estrelas, nosso Sol não sofrerá uma morte traumática; ele queimará seu combustível químico seguindo uma evolução mortal até transformar-se em uma anã branca (estrela morta, com tamanho comparável ao da Terra e sem brilho).
Ondas gravitacionais são como ondulações no espaço-tempo (Foto: Reprodução)
Buracos negros fascinam a todos e já foram temas de diversos livros e filmes. Lembram do filmeInterestelar? Há várias questões relativísticas abordadas na obra de ficção científica de Christopher Nolan. Com relação à famosa cena em que discute-se entre os astronautas a descida ou não ao planeta de Miller, surge a informação de que para cada hora passada no planeta, sete anos se passariam para quem está longe dele. A explicação dada no filme é de que essa distorção temporal seria causada pelo fato do planeta ter uma órbita muito próxima à um buraco negro, o Gargantua. Pois é, esse efeito temporal ocorre de verdade. Longe da situação do filme ser real, apenas relembro que a previsão teórica em conformidade com as equações de Einstein é que a matéria (no caso o buraco negro) distorce o espaço-tempo (causando o intenso campo gravitacional do planeta Miller e sua passagem temporal distorcida). Não se sinta mal por não entender logo de início,  esses comportamentos são estranhos à nossa intuição e precisam do auxílio matemático para seu entendimento completo. Mesmo assim, eles nos seduzem completamente.

Por fim, mas longe de ser menos importante, ressalto a maior contribuição prática da Relatividade Geral: o GPS.  Graças à essa "Senhora Centenária", esse aparelho – um dos mais úteis da atualidade – foi inventado. Seu funcionamento conta com um sistema de satélites que emitem sinais de rádio viajando na velocidade da luz. Por essa razão, as correções temporais dos sinais de rádio são feitas utilizando a RG.Ondas gravitacionais também são um caso particular de soluções das equações de Einstein.Sua observação cosmológica portaria as informações mais antigas a respeito da formação do Universo logo após o Big Bang. Atualmente, o observável mais antigo é a radiação cósmica de fundo (em inglês, cosmic microwave background, ou simplesmente CMB). Ondas gravitacionais, no entanto, carregam informações ainda mais primordiais e daí vem o interesse de sua busca.
E você acreditava que RG não tinha nenhum impacto na sua vida? Agora já sabe que além dela ser intrigante, é muito poderosa e útil. Newton explicou como calcular a gravidade, mas Einstein desenvolveu novos conceitos e explicou de fato, o que é a gravidade.
*Mariana possui graduação em Bacharelado em Física pela Universidade Federal de São Carlos (2008), mestrado em Astrofísica pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (2011) e doutorado em Física pela Universidade Federal de São Carlos (2015). Atualmente é pós-doutoranda na UFSCar e colaboradora no Observatório astronômico universidade.

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