Num de seus relatos mais labirínticos, Jorge Luis Borges fala de Uqbar, país de localização imprecisa, possivelmente situado na Ásia Menor. No volume XLVI da The Anglo-American Cyclopaedia (Nova York, 1917), Borges encontra um verbete sobre o misterioso lugar, mas as referências geográficas (as terras baixas de Tsai Jaldum, o delta do Axa) mais confundem que elucidam. O breve texto enciclopédico diz, porém, que a literatura em Uqbar é de caráter fantástico e todas as sagas transcorrem na região imaginária de Tlõn. O maior mistério é, no entanto, o próprio verbete, que aparece em exemplares esparsos da The Anglo-American Cyclopaedia, como se tivesse sido inserido clandestinamente em alguns volumes apenas.
Mais tarde, o autor descobre outro livro, de 1001 páginas, chamado A First Encyclopaedia of Tlõn, vol. XI , Hlaer to Jangr. O tomo igualmente enigmático descreve tigres transparentes, torres de sangue e um planeta que desconhece o conceito de tempo. Em Tlõn, uma maçã no chão é apenas isso: uma maçã no chão. É impossível para um nativo compreender que a maçã um dia esteve na árvore, de onde caiu. O passado é uma suposição metafísica. Também é impossível conceber que a maçã apodrecerá ao sol, pois o futuro é apenas uma esperança do presente. Desprovidos da idéia de causalidade, os habitantes dessa terra estranha se lançam em bizarras especulações nos campos da metafísica e da ciência.
A descoberta da enciclopédia de Tlõn não encerra a aventura de Borges. As investigações o levam, finalmente, a desvendar o enigma. No século 17, em Londres, uma sociedade secreta resolveu inventar um país chamado Uqbar. Cada associado nomearia um discípulo que continuaria a invenção através dos séculos. A idéia era produzir informações falsas e inseri-las cuidadosamente em enciclopédias e bibliotecas. E, 1824, o cético e niilista milionário americano Ezra Buckley filia-se à Ordem. Buckley pensa que inventar um país é muito pouco. Melhor seria desafiar Deus e criar um mundo inteiro, com sua arquitetura e seus poetas, seus baralhos e sua metafísica. Financiada por Buckley, a sociedade secreta amplia o projeto e inventa Tlõn. Trezentos colaboradores solitários elaboram os 40 volumes da enciclopédia do planeta. A conspiração prossegue com a fabricação e distribuição de objetos que só deveriam existir em Tlõn – cones pesadíssimos de metal que representam a divindade no planeta, por exemplo.
Embora Borges não nomeie a sociedade secreta, sabe-se que a primeira enciclopédia surgiu como um projeto iluminista. È possível, portanto, que a irmandade borgiana seja a misteriosa Ordem dos Iluminados da Bavária ou, simplesmente, Illuminati.
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